quarta-feira, 20 de junho de 2018

OS JOVENS E AS FANTASIAS DA FAMA


 



O filósofo Jean-Paul Sartre aconselhava seus discípulos a terem um projeto de existência. Isto é, a decidir o que queriam ser e fazer e, a partir daí, efetivar esse programa passo a passo, hora a hora. Esse projeto dizia respeito a um percurso longo, de realizações, de certas decepções e felicidade, mas extremamente necessário.
Essa ideia era para um mundo que tinha alguma estabilidade nas profissões, na economia, na política e na cultura. No mundo atual, isso não é mais possível, diz o sociólogo zygmunt Bauman. Hoje iniciamos em um serviço, amanhã em outro e assim por diante. Na época antiga quem entrasse como aprendiz nas fábricas da Ford ou Renault teriam ali uma longa carreira até sua aposentadoria. “Na atualidade, começamos em um lugar e não sabemos se amanhã estaremos no mesmo local”, arremata Bauman. “Isso faz uma diferença enorme em todos os aspectos da existência”.
A esse movimento, o autor chama de modernidade líquida, uma situação nas relações humanas em que nos vemos diante do dilema muito duro aos indivíduos que “precisam dos outros como o ar que respiram, mas ao mesmo tempo, têm medo de desenvolver um relacionamento mais profundo que o imobiliza em um mundo em permanente movimento”. Nesse ponto podemos localizar a noção de fama entre nós.
Preso nos fios de uma sociedade que gira á todo momento, que promete mudanças e felicidade permanentes desde que giremos na mesma rota que ela; a fama é uma dessas fantasias. Talvez a fama seja atraente porque ela significa aceitação da pessoa em uma  comunidade, em uma cidade, quem sabe até no país. Pensamos que os astros famosos sejam aceitos em todos os lugares do mundo. Que os jogadores de futebol mais famosos sejam pessoas mais felizes que nós e, também mais charmosos. Que as modelos de moda sejam as mais belas e vistam os melhores vestidos dos melhores estilistas. Que astros e cantores jovens são os mais bem sucedidos nas paradas. O mundo visto dessa maneira – só a partir da fama – ignora que há outros movimentos; o do imenso trabalho, da frustação, das dores, do tempo implacável  e, também das realizações e alegrias.     
No entanto, é bom saber que no caminho de nossa existência não desaparecem nossos medos e infelicidades, nem para os famosos. Eles estão sujeitos às mesmas leis que nós.  Ou seja, podem  de repente, ter desmoronado  o chão em que pisam. Um jogador de futebol, no auge da fama, pode ver sua existência ruir de um momento para outro, e nenhum banco, televisão ou empresário lhe ajudará. Eles irão em busca de outro famoso. Uma atriz com fama pode guardar uma existência difícil. Como a existência de todos os humanos, os famosos e a fama são submetidos às mesmas vicissitudes que as demais pessoas.
Os jovens são chamados a esse mundo de ilusões em que as instituições cedem espaço às fantasias da televisão, da mídia e da internet. Esse movimento faz com que o jovem pense mais ou menos assim: “Antes de ser eu já sonho em ser famoso”. E isso é a negação da própria experiência por que terá de passar. Na sociedade os jovens contam cada vez menos com as gerações mais velhas, dando lugar ao consumismo, ao ganho fácil, agindo como se fossem parafusos, onde as empresas, uma vez gastos esses parafusos podem trocá-los por outros. O mesmo acontece com o famoso quando decair, é trocado por outro famoso.
Mas, felizmente, resistimos a esse movimento frenético da fama e de seus criadores. Fica aqui o conselho do sociólogo Bauman  aos jovens: “Apesar de todas as tendências em contrário e de todas as pressões exercidas pelos promotores das fantasias, temos que ter na nossa memória e na consciência o valor da durabilidade, da constância, do compromisso e o único sentido duradouro, o único significado que tem chance de deixar traços de nossa passagem no mundo, deve ser o fruto do nosso esforço e trabalho”. “Os jovens podem contar unicamente com eles próprios e a ajuda de seus familiares, e haverá em suas existências o sentido e a relevância do que forem capazes de construir. Sei que essa é uma tarefa muito difícil... Mas é a única maneira de se realizar plenamente na vida.”
Cada jovem nasce em um ambiente geográfico-social que o leva a tomar determinadas atitudes. A coletividade influencia o jovem sem colocar obstáculos na sua liberdade, mas a escolha de seus atos depende, em larga escala, do ambiente, do lugar, do momento,  dos costumes e da sua vontade. O mais grave talvez seja o condicionamento do jovem achar que certas coisas são normais. O jovem ainda enfrenta muitas desigualdades precisando do seu discernimento para enfrentar essas situações, criando a sua própria maneira de viver no mundo e afastando as fantasias para enfrentar a realidade da existência...

Fonte:
Revista “Mundo Jovem” nº 435
+ Acréscimos e pequenas modificações.

Jc.
São Luís, 8/4/2018

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