Ainda pesa muito na consciência de certas pessoas o expecto terrível do inferno com suas penas eternas, criadas pelos teólogos que, esquecendo os ensinamentos de Jesus, relativamente à misericórdia de Deus, conceberam essa monstruosidade, que até hoje atormenta a muitos. Mesmo no meio espírita, há pessoas que, embora não temam o inferno eterno, acham que fatalmente irão para o Umbral por algum tempo, em razão de faltas cometidas nesta e em outras encarnações.
Recebemos, há alguns anos,
carta de uma irmã que havia cometido um aborto, antes de se tornar espírita.
Conscientizada da extensão do erro cometido e da necessidade de esforço para a
sua reparação, começou a colaborar na Casa Espírita que frequentava, onde
recebeu proposta de trabalho na evangelização infantil.
Como havia errado no
passado, ficou num terrível drama de consciência, pois se julgava indigna de
trabalhar junto aos pequeninos, ela que se negara a trazer uma criança ao
mundo. Então escreveu-nos uma carta pungente, dolorida mesmo, expondo-nos sua
angustiosa situação. Respondemos-lhe, dizendo:
“Estimada irmã. Recebi sua
carta, que mereceu a minha melhor atenção, e que passo a responder: Você diz
que fez um aborto. E um aborto é coisa
séria, mas não irremediável. A Doutrina dos Espíritos, trazendo-nos de volta os
ensinamentos libertadores e consoladores de Jesus, nos ensina que não há
condenação eterna, a não ser na teologia criada pelos seres humanos.
Você diz temer o Umbral, em
função do seu erro. É justa essa
preocupação, pois demonstra que você não é uma pessoa impenitente, mas,
pelo contrário, alguém que conhece a responsabilidade que assumiu quando errou.
Entretanto, não devemos julgar os nossos equívocos do passado com o
conhecimento que temos hoje. Os erros do passado, o fizemos dentro do
conhecimento que tínhamos. O importante é agora, que conhecemos mais
profundamente a Verdade, para não reincidir mais nos mesmos erros.
O perdão que o Evangelho nos
ensina, minha irmã, deve chegar até nós também!
É importante que nos perdoemos e compreendamos
que aquilo que está feito,
está feito e não nos é possível mudar. Devemos olhar para o passado, não para
lamentar, mas para tirar valiosas lições e experiências. Lembre-se de que
depois que se foram aqueles que acusavam a mulher apanhada em adultério, Jesus
lhe perguntou: “Mulher, onde estão os teus acusadores; ninguém te
condenou?” E ela disse: ”Ninguém,
Senhor”. Disse-lhe então Jesus: “Nem eu também te condeno; vai e não peques
mais”.
Lembre-se também, de
Madalena que era uma mulher que vivia do seu corpo, entregando-se a homens
ricos e poderosos, a fim de manter a vida de luxo e gozo. Quem sabe se ela não
terá feito até abortos? Quando ela conheceu Jesus, acordou para uma nova
existência, rompendo com aquele passado equivocado. Jesus lhe recebeu com o
mesmo respeito com que recebia as outras mulheres que faziam parte do grupo que
o acompanhava, e enfrentou até mesmo a incompreensão dos Apóstolos, que viviam
presos aos preconceitos contra a mulher. O Mestre deu-lhe a oportunidade de
dignificar-se através do trabalho no bem, que ela desenvolveu entre os
leprosos. Ao final da existência, foi recebida pessoalmente por Jesus. (Leia o
capítulo 20, com o título “Maria de Magdala” do livro “Boa Nova”, de Humberto
de Campos, psicografia de Chico Xavier.)
Hoje, você não tem leprosos
para tratar, mas tem crianças para evangelizar. Lembre-se de que podem ser
leprosos da alma que, reencarnados, serão curados através do Evangelho de Jesus
que você irá ensinar-lhes. O apóstolo Pedro, na sua Primeira Carta, no capítulo
4, versículo 8, diz: “A caridade (o amor) cobrirá a multidão dos pecados”. Em
relação ao Umbral, que tanto a preocupa, lembre-se de que só irão para zonas de
sofrimentos aqueles que continuam agindo no mal, que não despertaram para o
bem.
Veja o exemplo, no livro
“Voltei”, do irmão Jacob, psicografado por Chico Xavier, no capítulo 7: - Você
verá que um assassino estava sendo levado num grupo, conduzido por Bezerra de
Menezes, a uma colônia espiritual, onde seria recebido com respeito e
fraternidade. Por quê? Por privilégio? Não, nem proteção de última hora, mas
sim por mérito adquirido depois que se arrependeu e pôs-se a trabalhar no bem,
a fim de compensar o mal anteriormente praticado. O mal que fazemos exige
reparação, e não punição.
Deus, segundo nos ensina Jesus, não quer o nosso
sofrimento.
Quer apenas que trabalhemos
no bem, e quando uma pessoa está trabalhando no bem, ninguém vai tirar-lhe a
oportunidade de servir, para colocá-la em regiões de sofrimento. Se você está
evangelizando, vai continuar o seu trabalho abençoado depois de desencarnar,
pois no mundo espiritual também há espíritos de crianças a carecerem de
orientação.
Quanto ao filho que você não
quis ter, lembre-se de que é filho de Deus e que poderá tê-lo numa nova
encarnação, talvez até mesmo nesta, se encontrar um homem que a respeite e
queira não apenas aproveitar-se de você, mas ser pai de seus filhos. Há, ainda,
a alternativa de adoção, pois há tantas crianças carentes de uma mãe neste
mundo. Quem sabe se você não está encaminhando – agora na evangelização – o
mesmo Espírito que rejeitou, e que veio por outra mãe?
Assim, minha irmã, não tema o futuro e nem
guarde sentimento de culpa. Lembre-se de que não existe ninguém no mundo que
não tenha errado, nesta ou em outra existência. É sempre tempo de renovação.
Jesus nos ensinou que Deus é amor, é misericórdia, e não castiga nenhum dos
seus filhos!
Observe que você – como diz
em sua carta – queria apenas ser faxineira no Centro Espírita, mas os
Espíritos, vendo a sua boa vontade e o seu desejo ardente de redimir um passado
culposo, deram-lhe a oportunidade de trabalhar justamente no campo infantil.
Não é isso significativo? Seu
arrependimento foi sincero e bem aceito pela Espiritualidade. O acaso não
existe, minha irmã. Valorize a oportunidade que recebeu e agarre-se a ela.
Sinta-se dignificada, esforce-se, estude, ore e confie. Jesus está com você.
Esteja você com Ele! Receba um abraço do seu irmão”, Passini
P.S. Já
nos havíamos esquecidos do fato acima, quando, poucos anos depois, em cidade
próxima, encontramos a referida irmã, feliz, no trabalho de evangelização
infantil.
Fonte:
Revista
“Reformador” – maio/2014
+
pequenas modificações
Jc.
São
Luís, 10/06/2014