A busca por prazer e diversão como fuga do tédio leva o ser humano a se afundar cada vez mais em seu egoísmo, em seu individualismo. Diante disso, a figura do próximo perde sua verdadeira dignidade, tornando-se apenas um adereço. Nosso contexto econômico, político, social, cultural e até religioso aponta sempre para o individualismo.
Coloca-se o indivíduo no
centro, porém o lado sócio afetivo do ser humano parece que cada vez mais é
colocado de lado, como se este não tivesse valor algum. Com isso, o altruísmo,
a valorização do próximo, a ética, a fraternidade, tudo isso fica de lado;
afinal são questões que envolvem o próximo, o outro com quem temos que conviver
e com quem formamos um conjunto, a humanidade. Nossas características, nossos
sentimentos, nossa linguagem, nossos pensamentos... Tudo se forma porque
fazemos parte de uma cadeia, nos inserimos em um ciclo de relações. Assim,
carregamos a história e a cultura, porque fazemos parte de um todo maior do que
simplesmente um mundo formado exclusivamente por mim, pelas minhas impressões,
pelas minhas ideias, pelas minhas vontades, enfim, pelo totalmente subjetivo.
Várias foram as correntes
que levaram a sociedade a cair nesse individualismo. Tudo levou a abrir a
perspectiva para o individualismo, e de forma especial, ao hedonismo (corrente
filosófica que coloca o prazer como bem supremo da existência humana), à busca
desenfreada pelo prazer, algo tão característico de nosso tempo. Como não é
difícil concluir, tudo o que é extremo traz seus lados negativos e nosso tempo
pede uma síntese dos traços positivos dos séculos anteriores para solucionarmos
os problemas que o século XX trouxe de forma especial o individualismo, fruto
do hedonismo alienado de nossa era, grande gerador da depressão em razão da
falta de valorização do próximo, do outro, em nossas vidas. O tédio é uma
expressão da falta de sentido na existência das pessoas no mundo contemporâneo.
Hoje é comum vermos as
pessoas falarem que estão entediadas, que tudo é tedioso, que nada resolve essa
situação de tédio. É até estranho vermos pessoas reclamando tanto do tédio,
sendo que, se olharmos à nossa volta, não faltarão problemas a serem resolvidos
e situações nas quais podemos nos engajar para construir um mundo melhor. No
Brasil, quantos não são os problemas de ordem social? Porém, o engajamento em
situações ou lutas para a solução de problemas trará sempre algum tipo de
prazer ou diversão. Logo, o que concluímos é que esse tipo de tédio na verdade
revela como as pessoas estão se tornando vazias e estão se perdendo, perdendo
seu lado humano, exatamente por causa do individualismo exagerado.
A partir da questão do
desejo, na relação do ser humano com o mundo, Schopenhauer (1788-1860), abre
espaço à frustração que o ser humano está sujeito a viver por causa de suas
vontades. Ele sofre por não conseguir realizar seus desejos muitas vezes, o que
torna sua existência infeliz. Porém, fazer com que o objetivo seja alcançado,
lutar por ele, não significa uma vitória.
A realização de um objetivo, a conquista de um desejo, é caminho para um novo desejo. O
mesmo se mostra nas aspirações e nos desejos humanos cuja realização sempre nos
acena como o fim último do querer; porém, assim que são alcançados já não se
parecem os mesmos e, portanto, logo são esquecidos, tornam-se caducos, embora
não se admita, são sempre postos de lado como ilusões desfeitas.
Muito feliz é quem ainda tem algo a desejar,
pelo qual se empenha, pois assim o jogo continua entre o desejo e a satisfação,
e entre esta e um novo desejo, cujo transcurso, quando rápido, se chama
felicidade, e quando é lento se chama sofrimento. Dessa forma, surge assim a
ideia do “pêndulo”. A vida humana é um pêndulo entre o desejo o sofrimento e o
tédio. Desejamos alguma coisa, queremos muito, porém, nossa felicidade, que
supúnhamos encontrar na obtenção da mesma, acaba por se demonstrar uma grande
ilusão, afinal, a obtenção da mesma não nos saciou e não nos satisfez
plenamente. Cabe ao ser humano resignar-se diante dessa comprovação e
compreender que nenhum desejo, por mais que possa ser satisfeito, trará ao ser
humano a felicidade perene.
Em alguns momentos fugimos
do tédio, em outros, fugimos do sofrimento. Eles fazem com que seres que se
amam tão pouco, como os humanos, frequentes vezes procurarem uns aos outros se
tornando assim a fonte da sociabilidade. Os homens precisam dos outros à sua
volta, podemos dizer utilitarista, na qual o outro lhe é necessário, porque lhe
é útil, torna-se um objeto de uso que serve para por fim ao tédio, para lhe
tirar de uma situação que o incomoda, por que suas vidas estão vazias. Também a
busca por prazer e diversão como fuga do tédio leva o ser humano a se afundar
cada vez mais em seu egoísmo, em seu individualismo, e o outro cada vez mais
vai perdendo sua dignidade, tornando-se apenas um adereço.
Tal situação nos assusta e
fica a pergunta: “aonde isso irá nos levar?” Talvez o engajamento em causas
humanitárias, que crescem cada vez mais no mundo, mas que ainda é insuficiente,
transforme essa sociedade e seja a melhor forma de nos livrarmos do tédio e
darmos sentido a nossas vidas. Vivemos uma era em que tudo é superficial. As
relações, de uma maneira geral, parecem que nascem para não durar. Tudo isso
mostra que a preocupação com o outro, perdeu espaço neste mundo, e que este foi
tomado somente pelo culto do “eu”, e esse culto, essa busca pelo prazer, faz
com que a sociedade de maneira geral não se volte para a solução dos problemas
reais da sociedade, ou da humanidade de forma mais ampla. É como se a prazer
pessoal fosse mais importante que o bem-estar da humanidade.
Em um país como o nosso,
marcado pela cultura do “carnaval” e pela preocupação
com os realities shows que nos bombardeiam nas mais diversas emissoras
de TV, vemos formas de se fugir do tédio, mas também nos desvia do que
realmente deveria ser nosso foco. Lucraríamos muito mais, se nossa real intenção
de fugir do tédio se desse por meio de uma melhor conscientização em todos os
aspectos. Nada adianta ficar querendo ceder aos nossos desejos somente para
apaziguar nosso tédio, porque isso não irá garantir nossa felicidade.
Poderíamos muito bem usar nossos esforços de maneira menos egoísta e
individualista, de forma mais altruísta, sabendo reconhecer que o outro com
quem convivemos deve ser valorizado. Assim, o engajamento em causas sociais
beneficentes, pode ser a melhor maneira de se conseguir amenizar e até acabar
com o problema do tédio, lutando contra todas as formas de alienação...
Fonte:
Revista
“Filosofia” – 08/2012
Rodrigo
dos Santos Manzano
+
Pequenas modificações
Jc.
São
Luís, 22/10/2013