sexta-feira, 20 de abril de 2018

NOSSOS MEDOS




 
Classificamos o medo como um dos piores inimigos do ser humano, por alojar-se na alma, atacando as energias mais profundas. Segundo a Enciclopédia Larousse Cultural, por definição: medo é o sentimento de inquietação, de apreensão em face de um perigo real ou imaginário. A palavra medo se relaciona também com receio, temor, horror, pavor e pânico. Vejamos como se expressou sobre o medo, o filósofo inglês Thomas Hobbes, há muito tempo discutido nos meios da psicologia: “O medo é um sentimento que nos inspira sermos afetados por um mal real, de um mal que conhecemos pela experiência.”

Nós, espíritas, bem sabemos que além dos “males reais”, visíveis, tangíveis, existem também os medos invisíveis, intangíveis, que são provocados pelas obsessões. De início, se analisarmos desde quando o ser humano tem medo, certamente chegaríamos a idade da pedra lascada, com nosso ancestrais refugiados nos fundos das cavernas, ante os grandes perigos dos raios, dos trovões, dos furacões, dos vulcões, dos terremotos, dos animais, etc. etc. Tais acontecimentos, hoje bem explicados, antes, eram tidos como sobrenaturais e determinados por deuses terríveis e vingativos. Holocaustos, oferendas e promessas faziam os homens naquela época e, pelo jeito, não diminuíram a cólera daqueles deuses...

Joanna de Angelis faz uma análise do medo e apresenta seis aspectos, como responsáveis pela cultura ancestral geradora do medo, que nós trazemos embutida no inconsciente individual, e que essa culpa nos leva a uma situação tormentosa.

O primeiro medo é o da morte.  Pelo instinto de conservação da existência terrena, nós gostaríamos de não envelhecer e de não morrer, ou seja, não deixarmos o corpo que temos e não perder a nossa individualidade; o que é uma ilusão porquanto o corpo está sempre em constantes transformações. Deus no-lo deu para que nós o preservemos até que ele preencha a finalidade para a qual foi elaborado. E, apesar do instinto de conservação, não são poucos os que se atiram no labirinto da morte, por quase nada, pelas portas do suicídio.

O segundo medo é o da velhice. Ela nos aproxima da morte e a pessoa teme envelhecer porque fica mais sujeito a ela. Isto é um pequeno engano, porquanto morrem tantos jovens, tantas crianças, e hoje a população de idosos é quase igual a dos jovens, em face das conquistas da medicina e da tecnologia farmacêutica, que tem alongado a existência da espécie humana. Mas o ser humano tem pavor de envelhecer. Esse período não deveria ser chamado de velhice, que parece um termo depreciativo, mas de idade da experiência, ou idoso.

A idade idosa é uma dádiva de Deus, que nos livra de vários inimigos, quais sejam: Da ambição, da posse, da escravidão e do sexo. O Senado Romano e o Grego eram formados por pessoas idosas, respeitáveis e experientes. É verdade, entretanto, que temos muitos idosos não muito respeitáveis.... Quando, pois, lhe chamarem de velho(a) responda assim: Eu tenho a felicidade de ter chegado até aqui, enquanto você não sei se vai chegar, e se chegar, estará idoso também. Velho mesmo é o mundo, que já existia quando chegamos e vai continuar existindo quando partirmos.

O terceiro medo é o da doença. Isto porque a doença nos ameaça com a morte. Nem sempre é assim... a grande maioria dos doentes ficam bons. Porém, em nosso inconsciente, quando chega a doença, logo vem o medo da morte. Existem pessoas que, de tanto medo de morrer, se tornam hipocondríacas, isto é, pessoas hipocondria, com obsessão de doenças, médicos, remédios e tratamentos.

O quarto medo é o da pobreza. O indivíduo na pobreza não dispõe de recursos para comprar remédios quando adoecer, a fim de evitar a ameaça da morte. A pessoa que vive na pobreza acredita que vai morrer antes, pela falta de alimentação adequada, o que nem sempre acontece, pois muitas pessoas nessa situação ultrapassam a casa dos noventa e cem anos. Morre-se mais de excesso de comida ou alimentação irregular, do que pela falta de pão.

O quinto medo é o da opinião dos outros. Esse medo não tem nada a ver com a morte, mas é uma forma de morte, porque, quando descobrimos que os outros têm opinião diferente e negativa a nosso respeito, isso se torna um tormento na nossa alegria. Gostaríamos que todos tivessem um excelente conceito sobre nós, embora nos permitimos o prazer de não ter boas opiniões a respeito dos outros. As pessoas quando dizem que estamos com aspecto doentio ou envelhecido, logo nos vem a lembrança da morte.

O sexto medo é o da perda de alguém querido. Nenhum sofrimento na Terra se compara ao daquele que observa um seu ente querido sem vida, em grande silêncio. Devemos, entretanto, reprimir o desespero e a mágoa no coração, porque sabemos que os chamados “mortos”, são apenas ausentes na Terra, vivendo agora na Espiritualidade. Jesus ensinava a superioridade da alma – o espírito encarnado – que é eterno, sobre o corpo físico por ela usado em cada existência, e abandonado como roupa velha que não serve mais. Quando tomamos conhecimento da sobrevivência da alma, atravessamos todas essas situações com a maior naturalidade. A existência terrena é por algum tempo, enquanto que a vida, que representa a centelha divina é permanente.

Esses seis medos produzem o impacto dos outros medos existenciais, que mencionaremos a seguir e que aterrorizam os seres humanos:

Medos naturais: São os medos com os quais praticamente todos nascemos; medo do fogo, medo dos trovões, do mar, do desconhecido, da morte. O medo da morte se prende à infância, quando a criança sem o despertar da razão, vê os familiares com grande sofrimento em velórios e enterros de parentes ou amigos; com isso, instala-se no subconsciente infantil, que aquilo (a morte) é terrível...

Medos amigos: São os ditados pela prudência, e é por eles, que os seres vivos mantêm sua existência, como por exemplo: - O vegetal procura a luz e a água, evitando a sombra e a seca, na qual feneceria; - o animal foge do predador ou do combate no qual esteja em desvantagem, para continuar a existir; - o ser humano evitará as conseqüências prejudiciais; não brincar à beira de abismos; não riscar fósforos próximos a combustíveis; não entrar no mar sem saber nadar; não reagir a um assaltante armado, etc.  Esses são medos frutos da prudência, ditados pelo instinto de conservação, que nasce com as criaturas.

Medos inimigos: São os causados pela inação, como por exemplo: Medo de mudanças, de mudar de casa, de mudar de emprego, medo de sair de casa; medo de enfrentar desafios, medo de compromissos, de responsabilidades, sejam eles familiares, sociais, profissionais, religiosos, etc.

Medos irracionais: São os que bloqueiam os sentimentos e a razão; - medo de ir ao dentista, medo de falar em público, medo de assalto, medo de infecção, medo de altura, medo da morte, medo de andar de avião. É verdade que há desastres aéreos, mas o avião é centenas de vezes mais seguro que viajar de carro, comprovado pelas estatísticas.

Medos imaginários: Esse é o mais prejudicial dos medos, pois o medo real têm raízes no passado, a expressar-se no presente. Agora a pessoa ter medo de algo que ainda não aconteceu? Exemplos: - Um jovem que sofre por antecipação,  a angústia de não arranjar uma namorada; de não ser bem aceito no grupo, de não ser bem sucedido nas provas, de se sentir inferior aos outros, de ficar preso em um elevador; medo de terrorista, medo de tempestade, medo  de sofrer um desastre. Esses medos podem atingir a fase de pânico. A síndrome de pânico é originária de “Pan”, deus grego, tocador de flauta que metia medo nas pessoas com seus chifres e pés eqüinos (minotauro).

Existem ainda as fobias, que são medos exagerados e persistentes. Entre estes citamos: Claustrofobia – medo de lugares fechados.  Alto-fobia – medo das alturas. Gerontofobia – medo de envelhecer.  Necrofobia – medo da morte.  Antropofobia – medo da sociedade; a pessoa se isola. Obeso-fobia - medo de engordar, principalmente as que são modelos. - O fóbico sofre terrivelmente com sensações,  falta de ar, palpitações, etc...

Vencendo os Medos: Todos nós, sem exceção, temos nossos medos... Sempre resultam desses medos, grandes ou pequenos desconfortos. Assim sendo, impõe-se que idealizemos uma “administração” dos nossos medos. Em primeiro lugar, nada melhor do que identificar e classificar o medo que sentimos. Uma vez identificado e classificado, o trabalho a seguir é realizar um estudo da origem dele. Devemos saber que a Humanidade sempre se defrontou com o medo e poucos foram os que se dedicaram a estudar e explicá-lo; primeiro para poderem entendê-lo, para em seguida eliminá-lo. Todos fracassaram, uma vez que o medo, enquanto sentimento de evitar o mal é um instrumento de sobrevivência de todos os seres vivos. Até porque, há a classe de medos que é muito benéfica como vimos anteriormente. Dessa forma, o medo tanto pode ser um amigo como um inimigo.

Se o perigo for real ou imaginário, o medo também o será. Para um medo ser identificado, necessário se torna compreender como ele se instalou, melhor dizendo, como é que ele “apareceu”; quando, como, por que. Quase sempre o medo se disfarça, lançando mão de símbolos, num processo muito parecido com os sonhos, cuja interpretação é sempre problemática, justamente pelo simbolismo com o qual a maioria se apresenta ao sonhador. O medo pode e deve ser trabalhado para se tornar um instrumento de equilíbrio em nosso dia-a-dia.

Em todos esses medos, se a pessoa não conseguir dominá-lo racionalmente, um bom caminho a seguir, será procurar um aconselhamento: a)- Na fé; em primeiro lugar, fazendo orações a Jesus ou ao nosso Pai Celestial, pedindo a proteção, para o problema; b)- na família; ouvindo a experiência dos pais ou familiares mais íntimos: c)- na ajuda da Casa Espírita, por um orientador espiritual, disposto a ouvi-lo com  humildade, que poderá sugerir uma terapêutica evangélica, se houver alguma influência de um desencarnado; d)- Na assistência de um psicanalista...

O medo na Doutrina:  A Doutrina dos Espíritos explica que todos nós temos um extenso passado de múltiplas existências terrenas, que espelham atualmente nosso painel de emoções e sentimentos, painel esse que se atualiza minuto a minuto. De posse de tão precioso entendimento, ao espírita será possível iniciar, por uma enérgica e sincera auto-reforma, um intenso e permanente tratamento, visando libertar-se de seus medos, manias, fobias, neuroses e eventuais psicoses. Também poderá, através de um tratamento espiritual, se libertar de certas situações infelizes, se estas forem de origem mediúnica; influenciação de espíritos. Na questão 919 de “O Livro dos Espíritos”, o Espírito de Agostinho nos dá preciosa maneira de nos conhecermos a nós mesmos, através do balanço diário das nossas ações, ao final de cada dia, como interrogação à nossa consciência. Na introdução da mesma obra, Allan Kardec registrou a propósito dos nossos temores o seguinte: “O Espiritismo mostra a realidade das coisas e com isso afasta os funestos efeitos de um temor exagerado”.

Tratando-se da realidade das coisas, o espírita compreende muitos fatos da presente existência, cuja origem pode estar em nossas existências passadas. Sabendo que o perispírito guarda indelevelmente as chamadas “matrizes psíquicas” (fatos marcantes de outras existências), não será difícil compreender que o medo, no presente, pode ter se originado em ocorrências do passado como por exemplos: -  medo de multidão; será que essa pessoa, em outra existência, não foi condenada e quem sabe até apedrejada em público, como se fazia antigamente? – Medo de altura; não teria essa pessoa se suicidado, ou sido vítima de queda de algum penhasco? – Medo do mar; não teria essa pessoa, em outra existência, se afogado? – Medo de lugares fechados; não teria essa pessoa, ficado presa e morrido num calabouço? – Medo de animais; não teria a pessoa morrido em outra existência por ataque de algum deles?  Esses exemplos são apenas no caso desses medos se terem  originado no passado ou em outras existências.

O medo impede a reflexão, a análise e a solução dos problemas do nosso dia-a-dia, qual lanterna que se apaga. Infinitos medos existem e infinitas são também as maneiras de administrá-los. Ele sendo real, a prudência, o enfrentamento com a oração sincera e a auto-reforma, possibilita o amparo do Alto. Contudo se o medo é imaginário, deverá ser enfrentado pelo “medroso” mediante auto-análise e também por aconselhamento e assistência. A Doutrina dos Espíritos assevera: se o medo é real, com uma oração fervorosa, ela possibilita o equilíbrio emocional.

Que o Senhor da Vida, nos possibilite a força necessária para afastarmos os medos existenciais.

   
Jc.
S.Luis, 23/7/2006.
Refeito em 15/4/2018

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