terça-feira, 24 de dezembro de 2013

A SOCIEDADE HIPER-MODERNA




  
Estamos vivendo os primeiros anos do século 21 e do terceiro milênio. Indiscutivelmente, percebemo-nos envolvidos por um contexto de capitalismo avançado, de consumo desenfreado, globalizado e de tecnologia e informatização. Muito se tem discutido sobre como denominar essa época. Gilles Lipovetsky, um dos melhores analistas dos paradoxos da nossa sociedade, afirma que vivemos a hipermodernidade; uma sociedade marcada pelo signo do excesso, pela cultura da urgência e do sempre querer mais.

Ele sustenta que essa sociedade é marcada pela funcionalidade, pelo movimento, pela fluidez e pelo declínio das tradicionais estruturas de sentido, em que os grandes sistemas de representação no mundo são tomados como objeto de consumo. Segundo o filósofo, a hipermodernidade lança mão do poder de dispositivos oriundos da lógica do consumismo e da moda – a novidade, o entretenimento e o bem estar. Tal lógica traz consigo uma das marcas do individualismo contemporâneo que é o culto ao presente. Urgência e instantaneidade são as novas medidas do tempo, reflexos da lógica do mercado. Assim, são, especialmente, a intensidade (velocidade) e a quantidade (volume de informações) as características gradativamente mais influentes no movimento das transformações atuais.

Atentemos para o exemplo das relações humanas que, não raramente, são de pouca duração. Tudo passa rapidamente; tudo é descartável. Imerso no frenesi da busca incessante e desenfreada pela satisfação plena, ocupado em ganhar mais para poder gastar mais e ainda estressado pela constante demanda de mais velocidade e produtividade, o ser humano contemporâneo não dispõe do tempo necessário para repensar suas experiências. Dessa forma, o indivíduo projeta no mundo dos objetos a solução para o enigma fundamental de sua existência. Fica claramente perceptível se tomarmos o fenômeno do consumo como exemplo: comprar pode ser uma tentativa de preencher um vazio interno, não apenas com objetos, mas especialmente com o que eles representam. Consumir uma marca significa consumir uma identidade.

Lipovetsky afirma ainda que vivemos numa sociedade que se torna cada vez mais porosa, onde as pessoas buscam realizar qualquer tipo de fantasia em busca de seu prazer. Ao contrário da ideia de contenção que se percebia em períodos anteriores, evidenciada, por exemplo, na intensa repressão dos impulsos sexuais, a nossa sociedade, de maneira geral, parece nos impelir ao prazer. Somos todos convocados a sermos autônomos, vencedores consumistas e realizadores. Devemos buscar sempre alcançar aquilo que representaria nossa felicidade, mas, evidentemente, estamos sempre nos sentindo aquém da realização desse desejo. Na hipermodernidade, nosso dever é ser feliz.

Desvinculado da tradição, o indivíduo se ressente da falta de uma referência que o oriente, balize suas ações e decisões morais; uma referência que o envie a uma figura reguladora, seja a ciência a razão ou Deus. Esse parece ser um aspecto essencial dos tempos atuais. Essa experiência se reflete também no conjunto de normas e valores que orientam a existência das pessoas. Tudo vale e se tudo vale nada vale. A falta de limites faz com que nos revelemos inaptos para lidar com as frustrações naturais da existência. Buscamos uma resposta imediata, pronta e certeira, que não nos exija um esforço de reflexão e interpretação. Não temos tempo a perder. Um novo pensar poderá abrir os nossos olhos?

A diferença fundamental entre a sociedade tradicional e a contemporânea é que hoje existe uma diversidade muito maior de instâncias que se propõem produtoras de sentidos e valores. Se na tradicional, a organização social obedecia a uma ordem vertical, em que as famílias e as empresas eram orientadas por uma figura superior (pai ou chefe), na hipermodernidade os ideais de pulverizaram, se horizontalizaram e, assim perderam a referência.

Os avanços do capitalismo moderno no que diz respeito ao aumento da produção industrial, do incremento nos transportes e na comunicação e o surgimento de novas técnicas, são os responsáveis pelo nascimento e desenvolvimento do consumo de massa. A sociedade, de modo geral, volta-se para o presente, para o novo, para o bem-estar, ou seja, consagra a ideologia do consumismo. A época da sociedade tradicional terminou. Tínhamos uma modernidade limitada; agora, é chegado o tempo da modernidade consumada, do consumismo que seria uma segunda modernidade, marcada pela angústia do ser humano de querer possuir tudo o que lhe vem aos olhos, frente à liberdade de escolha que a pós-modernidade lhe oferece.

Ninguém se contenta mais com o normal; é como se uma febre acometesse a pessoa para querer consumir tudo que seja supérfluo, que lhe chega ao pensamento ou aos olhos, mesmo que não tenha a mínima possibilidade de conseguir.  Essa é a sociedade hipermoderna...

 

Fonte:

Revista “Mundo Jovem” nº 24

Priscilla Braga

+ Supressões e pequenas modificações.

 

Jc.

São Luís, 16/9/2013

 

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