Estamos vivendo os primeiros
anos do século 21 e do terceiro milênio. Indiscutivelmente, percebemo-nos
envolvidos por um contexto de capitalismo avançado, de consumo desenfreado,
globalizado e de tecnologia e informatização. Muito se tem discutido sobre como
denominar essa época. Gilles Lipovetsky, um dos melhores analistas dos
paradoxos da nossa sociedade, afirma que vivemos a hipermodernidade; uma
sociedade marcada pelo signo do excesso, pela cultura da urgência e do sempre querer
mais.
Ele sustenta que essa sociedade
é marcada pela funcionalidade, pelo movimento, pela fluidez e pelo declínio das
tradicionais estruturas de sentido, em que os grandes sistemas de representação
no mundo são tomados como objeto de consumo. Segundo o filósofo, a
hipermodernidade lança mão do poder de dispositivos oriundos da lógica do
consumismo e da moda – a novidade, o entretenimento e o bem estar. Tal lógica
traz consigo uma das marcas do individualismo contemporâneo que é o culto ao
presente. Urgência e instantaneidade são as novas medidas do tempo, reflexos da
lógica do mercado. Assim, são, especialmente, a intensidade (velocidade) e a
quantidade (volume de informações) as características gradativamente mais
influentes no movimento das transformações atuais.
Atentemos para o exemplo das
relações humanas que, não raramente, são de pouca duração. Tudo passa
rapidamente; tudo é descartável. Imerso no frenesi da busca incessante e
desenfreada pela satisfação plena, ocupado em ganhar mais para poder gastar
mais e ainda estressado pela constante demanda de mais velocidade e
produtividade, o ser humano contemporâneo não dispõe do tempo necessário para
repensar suas experiências. Dessa forma, o indivíduo projeta no mundo dos
objetos a solução para o enigma fundamental de sua existência. Fica claramente
perceptível se tomarmos o fenômeno do consumo como exemplo: comprar pode ser
uma tentativa de preencher um vazio interno, não apenas com objetos, mas
especialmente com o que eles representam. Consumir uma marca significa consumir
uma identidade.
Lipovetsky afirma ainda que
vivemos numa sociedade que se torna cada vez mais porosa, onde as pessoas
buscam realizar qualquer tipo de fantasia em busca de seu prazer. Ao contrário
da ideia de contenção que se percebia em períodos anteriores, evidenciada, por
exemplo, na intensa repressão dos impulsos sexuais, a nossa sociedade, de
maneira geral, parece nos impelir ao prazer. Somos todos convocados a sermos
autônomos, vencedores consumistas e realizadores. Devemos buscar sempre
alcançar aquilo que representaria nossa felicidade, mas, evidentemente, estamos
sempre nos sentindo aquém da realização desse desejo. Na hipermodernidade,
nosso dever é ser feliz.
Desvinculado da tradição, o
indivíduo se ressente da falta de uma referência que o oriente, balize suas
ações e decisões morais; uma referência que o envie a uma figura reguladora,
seja a ciência a razão ou Deus. Esse parece ser um aspecto essencial dos tempos
atuais. Essa experiência se reflete também no conjunto de normas e valores que
orientam a existência das pessoas. Tudo vale e se tudo vale nada vale. A falta
de limites faz com que nos revelemos inaptos para lidar com as frustrações
naturais da existência. Buscamos uma resposta imediata, pronta e certeira, que
não nos exija um esforço de reflexão e interpretação. Não temos tempo a perder.
Um novo pensar poderá abrir os nossos olhos?
A diferença fundamental
entre a sociedade tradicional e a contemporânea é que hoje existe uma
diversidade muito maior de instâncias que se propõem produtoras de sentidos e
valores. Se na tradicional, a organização social obedecia a uma ordem vertical,
em que as famílias e as empresas eram orientadas por uma figura superior (pai
ou chefe), na hipermodernidade os ideais de pulverizaram, se horizontalizaram
e, assim perderam a referência.
Os avanços do capitalismo
moderno no que diz respeito ao aumento da produção industrial, do incremento
nos transportes e na comunicação e o surgimento de novas técnicas, são os
responsáveis pelo nascimento e desenvolvimento do consumo de massa. A
sociedade, de modo geral, volta-se para o presente, para o novo, para o
bem-estar, ou seja, consagra a ideologia do consumismo. A época da sociedade
tradicional terminou. Tínhamos uma modernidade limitada; agora, é chegado o
tempo da modernidade consumada, do consumismo que seria uma segunda
modernidade, marcada pela angústia do ser humano de querer possuir tudo o que
lhe vem aos olhos, frente à liberdade de escolha que a pós-modernidade lhe
oferece.
Ninguém se contenta mais com
o normal; é como se uma febre acometesse a pessoa para querer consumir tudo que
seja supérfluo, que lhe chega ao pensamento ou aos olhos, mesmo que não tenha a
mínima possibilidade de conseguir. Essa
é a sociedade hipermoderna...
Fonte:
Revista
“Mundo Jovem” nº 24
Priscilla
Braga
+
Supressões e pequenas modificações.
Jc.
São
Luís, 16/9/2013
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