O
filósofo Jean-Paul Sartre aconselhava seus discípulos a terem um projeto de
existência. Isto é, a decidir o que queriam ser e fazer e, a partir daí,
efetivar esse programa passo a passo, hora a hora. Esse projeto dizia respeito
a um percurso longo, de realizações, de certas decepções e felicidade, mas extremamente
necessário.
Essa
ideia era para um mundo que tinha alguma estabilidade nas profissões, na economia,
na política e na cultura. No mundo atual, isso não é mais possível, diz o
sociólogo zygmunt Bauman. Hoje iniciamos em um serviço, amanhã em outro e assim
por diante. Na época antiga quem entrasse como aprendiz nas fábricas da Ford ou
Renault teriam ali uma longa carreira até sua aposentadoria. “Na atualidade,
começamos em um lugar e não sabemos se amanhã estaremos no mesmo local”,
arremata Bauman. “Isso faz uma diferença enorme em todos os aspectos da
existência”.
A
esse movimento, o autor chama de modernidade
líquida, uma situação nas relações humanas em que nos vemos diante do
dilema muito duro aos indivíduos que “precisam dos outros como o ar que
respiram, mas ao mesmo tempo, têm medo de desenvolver um relacionamento mais
profundo que o imobiliza em um mundo em permanente movimento”. Nesse ponto
podemos localizar a noção de fama entre nós.
Preso
nos fios de uma sociedade que gira á todo momento, que promete mudanças e
felicidade permanentes desde que giremos na mesma rota que ela; a fama é uma
dessas fantasias. Talvez a fama seja atraente porque ela significa aceitação da
pessoa em uma comunidade, em uma cidade,
quem sabe até no país. Pensamos que os astros famosos sejam aceitos em todos os
lugares do mundo. Que os jogadores de futebol mais famosos sejam pessoas mais felizes
que nós e, também mais charmosos. Que as modelos de moda sejam as mais belas e
vistam os melhores vestidos dos melhores estilistas. Que astros e cantores
jovens são os mais bem sucedidos nas paradas. O mundo visto dessa maneira – só
a partir da fama – ignora que há outros movimentos; o do imenso trabalho, da
frustação, das dores, do tempo implacável e, também das realizações e alegrias.
No
entanto, é bom saber que no caminho de nossa existência não desaparecem nossos
medos e infelicidades, nem para os famosos. Eles estão sujeitos às mesmas leis
que nós. Ou seja, podem de repente, ter desmoronado o chão em que pisam. Um jogador de futebol,
no auge da fama, pode ver sua existência ruir de um momento para outro, e
nenhum banco, televisão ou empresário lhe ajudará. Eles irão em busca de outro
famoso. Uma atriz com fama pode guardar uma existência difícil. Como a
existência de todos os humanos, os famosos e a fama são submetidos às mesmas
vicissitudes que as demais pessoas.
Os
jovens são chamados a esse mundo de ilusões em que as instituições cedem espaço
às fantasias da televisão, da mídia e da internet. Esse movimento faz com que o
jovem pense mais ou menos assim: “Antes de ser eu já sonho em ser famoso”. E
isso é a negação da própria experiência por que terá de passar. Na sociedade os
jovens contam cada vez menos com as gerações mais velhas, dando lugar ao
consumismo, ao ganho fácil, agindo como se fossem parafusos, onde as empresas,
uma vez gastos esses parafusos podem trocá-los por outros. O mesmo acontece com
o famoso quando decair, é trocado por outro famoso.
Mas,
felizmente, resistimos a esse movimento frenético da fama e de seus criadores.
Fica aqui o conselho do sociólogo Bauman
aos jovens: “Apesar de todas as tendências em contrário e de todas as
pressões exercidas pelos promotores das fantasias, temos que ter na nossa
memória e na consciência o valor da durabilidade, da constância, do compromisso
e o único sentido duradouro, o único significado que tem chance de deixar
traços de nossa passagem no mundo, deve ser o fruto do nosso esforço e
trabalho”. “Os jovens podem contar unicamente com eles próprios e a ajuda de
seus familiares, e haverá em suas existências o sentido e a relevância do que
forem capazes de construir. Sei que essa é uma tarefa muito difícil... Mas é a
única maneira de se realizar plenamente na vida.”
Cada
jovem nasce em um ambiente geográfico-social que o leva a tomar determinadas
atitudes. A coletividade influencia o jovem sem colocar obstáculos na sua
liberdade, mas a escolha de seus atos depende, em larga escala, do ambiente, do
lugar, do momento, dos costumes e da sua
vontade. O mais grave talvez seja o condicionamento do jovem achar que certas
coisas são normais. O jovem ainda enfrenta muitas desigualdades precisando do
seu discernimento para enfrentar essas situações, criando a sua própria maneira
de viver no mundo e afastando as fantasias para enfrentar a realidade da
existência...
Fonte:
Revista “Mundo Jovem”
nº 435
+ Acréscimos e
pequenas modificações.
Jc.
São Luís, 8/4/2018
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